quarta-feira, 1 de junho de 2016

Almas oníricas


Algumas almas não se velam...
São aquelas que desterram
nossas vontades, nosso ser.
Em silêncio sepultam nossos pecados
 e com amor elucida nossos dons. Lo



São aquelas de grandeza onírica
que o entendimento humano não compreende,
nem a razão explica,
mas o coração aceita contrito 
e transcende com elas.

Luciene Almeida 01/06/16 (às 23:41)

sábado, 2 de abril de 2016

Prescrição aos 35

Deus! 
Faz-me de pedra
Para que eu suporte a queda
E tenha forças para recomeçar...


Deus! 
Faz-me rara entre os minérios
Provada no fogo, 
moldada como o ferro
Subjulgando os mistérios
da minha própria Vida e Morte

Dai-me forças para viver com fé 
um dia de cada vez
 professando sua verdade
de um jeito só meu!

Deus!
Por isso, te suplico...
Faz me de pedra?!
Que a forma seja secreta.
 Mas, a essência da alma, eterna!

Luciene Almeida (02/04/2016)


sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

A vida, segundo Jeconias Matos


Manhã de quarta-feira. Tempo chuveste como diria José Simão.  Dias assim são excelentes para ficarmos mais quietos, sem muito papo com ninguém. Dias assim são perfeitos para observarmos aquelas coisas bucólicas da vida que não notamos em dias de sol, como por exemplo, as gotas de chuva que vão caindo em pequenas cascatas até atingir uma planta seca, ou apenas fechar os olhos e ouvir o som da chuva.

Dias assim são ideais para refletirmos sobre questões existenciais ou como minha avó diria: "Ficarmos a toa, pensando na morte da bezerra".
Mas aí... contrariando sua intenção de ter um dia introspectivo, acontece o seguinte: você precisa sair de casa e pegar o ônibus. Por infelicidade, escolhe o pior lugar  que poderia para se sentar. Quem está sentado ao seu lado? Um indivíduo trajando uma camisa amarelo ocre, que diferentemente de você, quer falar (e muito!).

- Olá, tudo bem? Quanto tempo você é casada?
Trata-se daquele tipo de abordagem que você não está preparada para responder, daí então, solta algo como um...
- Ãh?! 
 Tudo bem que isso não é resposta que se dê, mas, tanto faz, porque o cara não quer saber de te ouvir. O negócio dele é falar, ou melhor, metralhar você verbalmente. E assim, até mesmo um suspiro que você der já servirá de inspiração para que ele se sinta instigado a falar cada vez mais.
- Eu estou casado há 47 anos!  Não tive filhos, graças a Deus! - pausa breve - Hoje em dia, você vê as notícias no jornal? Filho matando pai a doidado por aí. Ainda bem que não tive filhos... Ufa! ainda bem... E você tem quantos filhos?
- Um bebê.
- Só um?! Só um filho? Nossa!

Não sei porque, mas, ele realmente parecia inconformado com a resposta. Alguns segundos depois e não menos transtornado, ele muda de assunto e confidencia que há alguns anos decidiu comprar um terreno, mas que a esposa, na ocasião, recriminou-o por tratar-se de um lugar inóspito: "um fim de mundo para se morar" foi o que ele-me-disse-que-ela-disse-pra-ele, enfim... O fato é que o sujeito comentou que, na ocasião, vislumbrou a oportunidade de investir em algo promissor. Comprou o terreno e construiu aquela, que seria sua primeira moradia e que mais tarde se tornaria seu "ganha pão" com casas de aluguel.

- Ganho R$ 2.000,00 por mês com o aluguel e não tenho do que reclamar. Pra falar a verdade, não sei nem o que fazer com esta grana toda!!! Por isso, vou poupando no banco. Ah... Graças a Deus a vida é muito boa!

Embora seu matrimônio tenha passado por algumas intempéries ao longo de quatro décadas, o cidadão revela também que mantém a chama do relacionamento sempre acessa, levando sua senhora todos os dias para almoçar fora.

- Um real! Eu pago apenas um real e levo ela pra almoçar no restaurante "Bom Prato", que fica ali no morro do S. Lá, você come a vontade. Uma maravilha!
- Mas, o senhor não acha que seria bom almoçar em outro lugar de vez em quando? Ter momentos mais...intimistas talvez?
- Intimidado? Eu? De jeito nenhum! Com apenas um real eu almoço fora e quando muito gasto dois reais se resolvo levar ela pra almoçar no "Bom Prato" lá do Embu das Artes, que é um pouco mais caro, é verdade... mas é porque a cidade é turística, né? Mas vale a pena. Ah... a vida é boa demais. Eu posso dizer que sou 100% feliz!
Felicidade tirando férias sabe-se lá aonde.
- Sério? Tô impressionada. É uma raridade encontrar alguém que tenha certeza de que é 100% feliz. Se o senhor é, parabéns! Conta aí, qual é o segredo?
Ele riu e se empolgou:
- Ah! O segredo é levar uma vida modesta. E, claro, guardar um dinheiro pra quando adoecer. Você sabia que pra ser enterrado hoje, você gasta no mínimo R$ 3.500,00?
- É mesmo? Não, não sabia. 
- Pois é. Por isso, eu guardo meu dinheirinho todo mês. Pra não dar trabalho pra ninguém, né?
- Tá certo. Mas, pode ficar sossegado que pelo visto o senhor não vai morrer tão cedo. 


O ônibus parou, me despedi e aproveitei para descer rapidamente, deixando pra trás aquele homem com um sorriso amarelo,  transbordando a tal felicidade, que pra mim era um tanto quanto suspeita. 

Este é Jeconias Matos, evangélico da igreja Assembleia de Deus, nascido em Itapecerica da Serra, no dia 29 de julho de 1942, resolvido no amor, absurdamente feliz; adora estrogonofe de frango; não dirige porque um excelente vizinho o aconselhou a ficar longe dos altos impostos e gastos de manutenção; um homem que apesar do tempo, cultiva certo romantismo com sua senhora; enfim, um homem que encontrou seu lugar no mundo e que não perde tempo com questões existenciais, muito menos com bobagens de retiro interior em dias de chuva. 

Para ele, a vida é simples e boa; o amor existe, assim como os bons vizinhos, e graças a Deus, "os-filhos-que-matam-os-pais-antes-da-hora" não vieram e nunca virão para assombrar aquilo que ele define como modelo ideal de felicidade.